Venom: A Última Rodada fecha a trilogia com um ensaio de comoção
Terceiro filme ainda aposta no escracho mas com exagerada timidez
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[Crítica também publicada no Omelete, site que, assim como o Chippu, também é parte da Omelete Company]
Chegou a se comentar no lançamento que Madame Teia devolve aos super-heróis um senso de ameaça que esses filmes perderam com o passar dos anos, na dinâmica à moda Terminator entre protagonistas indefesas e um perseguidor implacável. O molde da Sony para os derivados do Aranhaverso segue mesmo essa lógica de volta-ao-básico, como agora atesta Venom 3 - A Última Rodada ao reciclar batidas de O Exterminador do Futuro 2.
Particularmente, além da estrutura de caçada mortífera (com direito a “visão de calor” no radar do vilão), este longa projetado para ser a despedida do anti-herói pega de James Cameron seu sentimentalismo: o laço afetivo com o público adolescente e a cena inspirada no clímax da fundição de T2 são as duas marcas mais evidentes dessa inspiração. A relação de Eddie Brock (Tom Hardy) com os civis que ele decide proteger, a família hippie de Martin (Rhys Ifans), é uma boa surpresa do filme e se presta a ser o núcleo emocional dessa despedida.
A essa altura da trilogia, esperar que Venom 3 justifique a presença de Ifans - que no multiverso do Homem-Aranha também interpreta o vilão Lagarto - parece um desperdício de energia. Inclusive Venom 3 começa, sem cerimônias, revertendo a conexão com o Aranha que foi sugerida no desfecho de Venom - Tempo de Carnificina (2021). Se esses filmes derivados primam pelo básico, por entregas muito pontuais de ação, dinamismo, humor e horror, talvez fosse muito deslocado mesmo esperar que, de repente, eles almejassem um fôlego de construção de mitologia.
O máximo que Venom 3 articula em termos de expectativa é colocar na boca do vilão Knull (voz de Andy Serkis) a exposição breve em que ele explica quem é e por que sua ameaça é tão terrível assim. Toda a exposição dessa ameaça, e especialmente o núcleo envolvendo os simbiontes renegados de Knull, os cientistas e os militares, drena de Venom 3 a agilidade que a comédia de estrada de Eddie Brock tenta imprimir na narrativa. O filme pega tração e transcorre mais célere quando todo o texto explicativo já foi dado (e repetido nas dispensáveis cenas envolvendo Stephen Graham).
Tirar da frente tudo que é supérfluo deveria ser o foco de um filme desses - como bem sabem os responsáveis, por exemplo, pela cenografia do laboratório militar, que colocam na parede da salinha do general (Chiwetel Ejiofor) uns diplomas emoldurados de general (!?) só pra gabaritá-lo - e não deixar a parede sem decoração nenhuma. O essencial é a volta-ao-básico, o que no caso de Venom pode muito bem se resumir à pantomima de Brock com seus monólogos delirantes e o descontrole sobre seus movimentos. Ver um ator rígido como Tom Hardy atuar desconfortável na função de boneco de posto é parte da graça de Venom.
Nesse quesito, Venom 3 pode ser decepcionante porque se esperaria que, num terceiro filme, onde não é preciso mais explicar muita coisa e todas as amarras foram soltas, já se permitisse ir mais longe. Desta vez, a roteirista e diretora Kelly Marcel substitui o escracho ostensivo pelo potencial igualmente cômico de acompanhar Hardy desolado, caminhando de um lado ao outro, depois de "um ano inteiro" consumido pelo simbionte. Essa imagem tem sua graça, mas não é exatamente uma imagem de efeito. À exceção de um número musical (sempre ele) este final de trilogia parece tímido em relação às suas oportunidades de encenação - e fica aquém, na comparação, do arrojo cartunesco com que Sam Raimi e Tobey Maguire criaram o Peter Parker emo de Homem-Aranha 3.
Se um dia a tendência ao caos e ao cartunesco deu o tom dos filmes de Venom, isso fica apenas sublinhado no terceiro, um longa que não parece muito disposto a inventar nada para além de um ensaio de nostalgia precoce e comoção.