O humor ácido, afiado e perturbado de James Gunn combinou perfeitamente com O Esquadrão Suicida. Mas, mais especificamente, ele combinou com a interpretação absurda, hilária, detestável e imprevisível do Pacificador de John Cena. O provável vencedor de uma enquete "qual personagem você mais detestou no filme", ele foi odiado por todas as razões certas: seus posicionamentos e falas inacreditáveis, sua caracterização exagerada, e sua eventual virada contra os protagonistas. Ao longo de todo esse tempo, ele providenciou momentos engraçados, mas sempre ficou claro como ele estava alguns degraus abaixo de, por exemplo, o Sanguinário (Idris Elba) em termos morais.

Logo, a escolha do Pacificador como protagonista de uma série própria no HBO Max foi no mínimo ousada e, no máximo, maluca.

Mas, três episódios depois, Gunn e a equipe por trás da série parecem ter concebido um ato de magia. A ideia do Pacificador como alguém capaz de segurar a narrativa como alguém com o qual devemos ter pelo menos um pouco de empatia parecia um absurdo ainda maior do que as crenças do próprio anti-herói. Agora? Eu quero passar mais tempo com ele. A questão é o que será sacrificado para obter isso.

Para conquistar essa difícil missão, o nível do inaceitável na criação do personagem de Cena precisou ser diminuído. Pelo menos uns 10%. Ele não pode parecer mais apenas uma caricatura, uma expressão artística do extremismo cômico, mas sim uma pessoa tridimensional, com interesses, passado, medos e desejos. Em alguns momentos, isso enaltece o tipo de humor visto inicialmente no filme, em outros, a proposta acaba deixando a ideia do Pacificador, como um todo, menos perigosa e interessante.

Mas quando Pacificador tenta deixar o Pacificador mais compreensível? O resultado é diferente. Não é que essas cenas ou ideias sejam mal desenvolvidas. Cena se mostra surpreendentemente versátil na atuação, entregando um trabalho genuíno quando emoções mais vulneráveis são necessárias, mas elas inevitavelmente tiram um pouco da magia inicial do personagem.

A realidade é que Pacificador, por natureza, se encontrou num beco sem saída. De fato, o personagem como visto em O Esquadrão Suicida jamais sustentaria 10 horas de televisão. A mudança em sua representação era obrigatória para tornar a série aceitável e divertida, mas ver Smith sofrendo porque a Emilia Harcourt da excelente Jennifer Holland não o dá bola instantaneamente retira um pouco do impacto do personagem.

Gunn e equipe merecem crédito por fazerem tudo isso de ótima maneira. Pacificador é a melhor versão possível dessa história, e as cenas de ação seguem com o mesmo nível de criatividade e humor visto no filme do ano passado. O que nos resta saber é: ao fim dessa temporada, ainda será divertido acompanhar esse personagem? Se seu desenvolvimento dramático nunca alcançar os ápices de suas risadas, como olharemos para a série?

Mas uma coisa é certa. A abertura é brilhante.