Os 7 de Chicago - Crítica do Chippu

Os 7 de Chicago - Crítica do Chippu

Vale a pena ver o novo filme de Aaron Sorkin na Netflix?

Guilherme Jacobs
15 de outubro de 2020 - 8 min leitura
Notícias

Há sempre uma expectativa que acompanha os filmes escritos por Aaron Sorkin (Questão de Honra, A Rede Social, A Grande Jogada - sua primeira experiência como diretor de cinema). Diálogos velozes mas compreensíveis, discursos extensos mas engajantes e argumentos sólidos mas com personalidade. Não é à toa, então, que o roteirista vencedor do Oscar se sinta tão em casa com filmes de julgamento. Talvez só um advogado esteja mais confortável dentro dos tribunais.

Afinal de contas, nesse ambiente temos tudo que se virou marca registrada de um dos roteiristas mais celebrados de Hollywood. Pessoas usando palavras para conquistar uma audiência e personalidade existindo não só como uma característica mas também como ferramenta de persuasão. Mentiras, semi-verdades, reviravoltas, entonação, interrupções, discussões. Dois ou mais personagens falam ao mesmo tempo, outras fazem discursos emocionantes. É um prato cheio para o escritor.

Nos três filmes citados acima, Sorkin escreve cenas de argumentação jurídica e depoimentos, mas só Questão de Honra pode realmente ser considerado um drama de tribunal. Agora, com Os 7 de Chicago, ele voltou para julgamentos, mas pela primeira vez está dirigindo além de escrevendo. Aqui, ele tem controle de toda a caixa de brinquedos. O filme aborda o julgamento de sete (na verdade oito) pessoas acusadas de iniciar protestos violentos em meio à Convenção Nacional do Partido Democrata dos EUA, em 1968. Não vai surpreender saber que todos os elementos mencionados no parágrafo anterior estão presentes no longa, lançado exclusivamente pela Netflix.

E como drama de tribunal Os 7 de Chicago é brilhante. Sorkin mistura seu roteiro dinâmico com uma direção mais focada do que mostrou em A Grande Jogada, e adiciona - através da edição veloz e precisa de Alan Baumgarten - montagens que mudam o ritmo de cenas e derrubam em cada minuto uma caneca de café. Ver filmes do Sorkin é como ingerir cafeína. Note como personagens começam a fazer discursos em momentos separados, relembrando acontecimentos, e com o andar do filme esses discursos são misturados com outras cenas, outros personagens e outras falas, para dar a impressão de que a conversa nunca acabou. Alguém sempre está falando.

Esse é, claro, um filme sobre palavras e o seu poder, tanto como instrumentos de argumentação jurídica como de protestos políticos. Mas se na primeira categoria Sorkin exibe uma completa dominação do gênero, na segunda ele deixa a desejar. Os 7 de Chicago certamente tem uma mensagem política, e é clara qual é a opinião do diretor sobre os acontecimentos centrais do filme. Mas definir essa mensagem parece ser algo que o próprio Sorkin não consegue fazer. Ele concorda que o julgamento foi injusto e que protestar é necessário, mas que tipo de protestos? E com que objetivo? Você pode dizer que a intenção dele é deixar a audiência com essas mesmas dúvidas, mas a impressão é de que ele não se consegue chegar nas respostas.

Talvez um bom exemplo disso seja o do procurador Richard Schultz (Joseph Gordon-Levitt). Ele é claramente o mais simpático dos “vilões” do filme. Mas qual a intenção de Sorkin com ele? Dar voz ao estabelecimento? Certamente não. Dizer, apenas, que nem todo mundo no governo é ruim? Se for isso, é algo bem raso, e que é salvo apenas pela atuação convincente de Levitt, que passa uma decência marcante em suas cenas.

Talvez seja aí, na hora de cobrir defeitos, que o elenco de super-estrelas do filme - que também inclui Sacha Baron Cohen, Mark Rylance, Eddie Redmayne, Michael Keaton, Frank Langella, John Carroll Lynch, Jeremy Strong e Yahya Abdul-Mateen II - se torne essencial. Sorkin tentar compensar suas falhas de argumentação política com falas ousadas, velocidade de diálogo e declarações ousadas. Seu elenco precisa estar à altura do roteiro para que essa estratégia funcione, e no geral eles entregam. Redmayne é o único que deixa a desejar com uma atuação que parece mais performance do que realidade. Penso que isso pode até ter sido essencial, já que seu personagem é o mais atrapalhado e ciente de si no filme.

O resto? Espetácular. Podemos falar da maldade passada por Langella, da honestidade de Lynch, loucura de Strong ou de como Michael Keaton, em apenas duas cenas, parece engolir o filme como um jogador reserva que saiu do banco para fazer a diferença no pouco tempo que tinha para jogar.

Mas precisamos destacar Cohen, que deve estar garantido como indicado ao Oscar com base na sua mistura de caos, leveza e inteligência. Seu personagem - Abby Hoffman - nunca deixa de apresentar rebeldia mesmo quando mostra que há mais em sua mente do que algumas pessoas podem pensar. Rylance é a melhor atuação do filme, trazendo uma revolta e emoção marcantes para seus argumentos. Ele interpreta o advogado William Kunstler, que defende os sete, e vai cada vez mais se envolvendo no caso e na razão dos protestos. Ele começa o filme com sua seriedade questionada, mas essa isso está mais do que resolvido no fim. Se alguém é o coração do filme, é ele. E então temos Abdul-Mateen II, que tal como Keaton, age como um ladrão de cenas, demandando sua atenção sempre que aparece em tela. Se atores fossem investimentos, eu diria para você comprar todas as ações dele agora. Seu valor só vai subir.

Ver Os 7 de Chicago, como ver tantos filmes este ano, é olhar pela janela. Imagens de protestos, violência policial e tensão racial encheram nossas telas de TV em 2020. Talvez por isso, é decepcionante que Sorkin não consiga capturar a essência dessas coisas num momento tão importante da história norte-americana. Mas o filme é, como já disse, um drama jurídico antes de ser qualquer outra coisa. Ele gasta mais tempo no tribunal do que nas ruas. E quando ele atravessa as portas e se vê diante do juiz, vemos que não há lugar no mundo onde ele e seu diretor prefiram estar.

Nota: 4/5

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