Orion e o Escuro: Animação escrita por Charlie Kaufman é simpática e imperfeita

Orion e o Escuro: Animação escrita por Charlie Kaufman é simpática e imperfeita

Lançado na Netflix, filme vai agradar crianças e adultos

Guilherme Jacobs
5 de fevereiro de 2024 - 6 min leitura
Notícias

Quando vemos Charlie Kaufman creditado como roteirista, criamos uma certa expectativa para o tipo de filme que vamos ver. Afinal de contas, estamos falando do responsável por roteiros excêntricos como Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças, Quero Ser John Malkovich e Anomalisa. Sua assinatura está visível em Orion e o Escuro, nova animação da Dreamworks lançada na Netflix, mas é possível percebê-la sendo apagada aos poucos.

Kaufman escreveu o roteiro, baseado no livro homônimo de Emma Yarlett, há anos, e o projeto quase não saiu do papel depois que a Dreamworks desistiu de lançá-lo. A Netflix então "salvou" o filme, no qual Orion (Jacob Tremblay no original), um menino de 11 anos de idade super medroso, especialmente quando o assunto é escuridão, recebe uma visita do Escuro (Paul Walter Hauser), uma manifestação da noite determinado a mostrar que não há razão para temê-lo.

A palavra "salvou" soa inapropriada para algo lançado sem cerimônia na biblioteca da Netflix (não há sequer um trailer no canal da Netflix Brasil), com um orçamento visivelmente abaixo do padrão Dreamworks, e especialmente porque esse processo parece ter afetado o roteiro, aqui e ali prejudicado por furos, motivações rasas e mudanças estranhas de tom. Ainda assim, o material base é tão cativante, especialmente na conceptualização das criaturas noturnas e na linda maneira como Orion é conectado com outras gerações, que é difícil não ser levado pelas emoções da animação.

É um testamento para o quão boa é a premissa iniciada por Yarlett, adaptada por Kaufman e encenada pelo diretor Sean Charmatz como uma aventura pronta para capturar crianças pela diversão e humor, e adultos pela maturidade. Quando Escuro finalmente convence Orion a passear pelo céu noturno, somos apresentados a uma gama de figuras lúdicas mas assustadoramente precisas com quem o gigante sombrio trabalha; há Insônia (Nat Faxon), sempre sussurrando ansiedades no seu ouvido; Sono (Natasia Demetriou), colocando todo mundo pra dormir com táticas duvidosas; Silêncio (Aparna Nacherla), deixando tudo quieto; e meu favorito, Barulhos Inexplicáveis (Golda Rosheuvel), que, como o nome sugere, mantém os humanos acordados com mistérios sem resposta.

É um prazer ver como o filme dá vida para as ilustrações de Yarlett, e Kaufman adiciona uma pitada bem-vinda de esquisitice aos acontecimentos que por um lado deixa o passeio mais imprevisível e interessante, e por outro começa a revelar os problemas de um quadro incompleto. Não me entenda errado. Orion e o Escuro tem começo, meio e fim, e é competente onde precisa ser. Contudo, é difícil não sentir que partes dele ficaram pelo caminho.

Seja no visual, onde os campos pintados com primazia são povoados por um design de personagens irregular (Silêncio é uma fofa, Escuro é genérico), ou no andar do enredo, onde conflitos e resoluções nunca são trabalhados, apenas surgem e desaparecem, Orion e o Escuro aparenta ter perdido um pouco de sua identidade e estranheza em meio a uma série de ordens do estúdio podando o longo para deixar tudo "mais infantil."

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As piadinhas sem graça e criação de um "vilão" numa história melhor servida pela ausência de conflitos, porém, são desnecessários. Orion e o Escuro conquista pelas personalidades do garoto e seus companheiros, especialmente quando descobrimos que tudo isso é uma história (memória?) contada pelo Orion mais velho (Colin Hanks) para sua filha, Hipátia (Mia Walker Brown), também assustada com as sombras ao seu redor.

Longe de ser uma reviravolta (essa revelação acontece com uns 15 minutos), a surpresa adiciona uma camada a mais ao filme; não só justificando guinadas inesperadas na trama (uma divertida viagem no tempo é apenas um dos frutos de uma imaginação fértil improvisando enquanto vai) mas também ajudando a colocar seus temas em foco. No fundo, Orion e o Escuro é sobre conviver com aquilo que você teme, e ao transformá-lo numa história de pai e filha, Charmatz e Kaufman posicionam essa ideia como algo geracional, usando a narrativa como ponte para transmitir os aprendizados de um para a outra, e vice-versa.

As sequências dos dois conversando de maneira honesta são intervalos bem-vindos em meio ao ritmo frenético do segundo ato (outra característica com a cara de um engravatado trabalhando para o serviço de streaming), dando espaço para os personagens e o público respirarem e considerarem não só os acontecimentos da história, como também seus significados. Isso resulta numa conclusão bem-construída, genuinamente tocante e infinitamente mais especial para quem assistir ao filme junto dos filhos. Nela, somos lembrados como a necessidade de reconhecer e se habituar com o medo nunca some, independente da sua idade.

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