
O novo Exorcista não é nada Devoto ao clássico de William Friedkin
Aos 50 anos, o filme de 1973 parece ser motivo de vergonha para o reboot moderno

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Assim como o demônio que Jesus mandou pros porcos, O Exorcista: O Devoto está possuído por Legião. Dentro desse filme existe uma tentativa de atualizar a ideia do exorcismo pro Século 21 com uma pluralidade de crenças, a jornada de um pai do ceticismo até a fé, e (supostamente) uma continuação da história da Chris MacNeil de Ellen Burstyn.
Mas assim como o possuído por Legião vivia sofrendo, o corpo de O Exorcista: O Devoto desmorona ao tentar conter todas essas existências, e dessa vez não tem um Salvador para libertá-lo. Afinal se havia uma figura messiânica, esta era William Friedkin, e muito antes de sua morte o diretor d'O Exorcista original de 1973 já havia deixado claro seu desinteresse nessa nova continuação.
Quem pode culpá-lo? Em relação ao clássico, o novo Exorcista só é Devoto em nome. Não é exagero chamar a sequência dirigida por David Gordon Green da antítese da atmosfera de opressão, perversão e sacrifício que permeava a possessão e o exorcismo de Regan MacNeil (Linda Blair). Friedkin nunca foi sútil, mas seu formalismo dava às imagens do que aconteceu naquela casa em Washington um fardo que potencializa os temas do filme, deixando a experiência absoluta em seu domínio de nossos sentidos. Ficamos hipnotizados (possuídos?) e vulneráveis aos ataques demoníacos manifestados, por exemplo, pela inserção do rosto de Pazuzu. É como se, junto com Regan, sofrêssemos com a infestação.
Em outras palavras, O Exorcista é bad vibes.
Friedkin foi na contramão da nossa pós-modernidade de aceitação de múltiplas verdades. Em 1973, o drama existe porque é preciso aceitar a verdade, isto é, que Regan está possuída pelo demônio. Pazuzu não estava apenas invadindo uma garotinha; ele estava pervertendo o idealismo norte-americano, o paraíso do subúrbio onde o terror não existia. Seja como uma distorção da chegada da puberdade destruindo a harmonia de uma casa, como uma interpretação do desafio de ser uma mãe solteira ou como um alerta de que, na sociedade racional, o sobrenatural é a força mais destrutiva, O Exorcista busca construir um Mal palpável e mostrar como é dura a batalha contra ele.
Essa é uma abordagem contrária ao clima de superação e realização pessoal do terror moderno, onde praticamente toda história começa e é abastecida pelo trauma (tipicamente da perda de alguém). Luto é a corrente elétrica dos roteiros, e afirmação, tipicamente da própria identidade, é o alvo. Isso pode ser visto em outros gêneros cinematográficos, mas parece mais óbvio no terror. Só em 2023: Boogeyman, Fale Comigo, M3GAN, Pânico VI e, agora, O Exorcista: O Devoto.
Se o primeiro Exorcista queria incomodar, o novo quer ser aceito. Para o tal, ele foge do viés do catolicismo pelo qual a maior parte dos longas sobre exorcismo, e inclui outras religiões que vão de diferentes visões do cristianismo — como o protestantismo de megaigrejas e pentecostalismo de pequenos templos — até crenças africanas. É uma ideia compreensível, mas que por ser profundamente mal executada não só prejudica o filme, como parece ativamente descreditar a proposta dessa franquia. O Devoto está mais para O Apóstata.
Se seu filme vai tratar da pluralidade de fés que existem pelo mundo, então ele precisa ser sobre isso. Adorado por alguns e detestado por muitos, O Exorcista II - O Herege pode pelo menos dizer que fez isso com mais inteligência e sucesso do que o filme de David Gordon Green e da Blumhouse. Aqui, o passo para longe do cristianismo é feito não para examinar as diferenças e similaridades de outras religiões, e disso tirar drama e temática, mas para tentar deixar o filme mais aceitável para as audiências plurais do Século 21. É como se O Devoto tratasse O Exorcista de 1973 como aquele seu tio com visões incompatíveis com a atualidade.
As fés são, na verdade, diminuídas (especialmente quando a presença de um padre parece oferecer salvação para o pastor e para a médium) e reduzidas a um sincretismo que soa mais como um discurso de autoajuda. Gera-se um climinha de amor, de abraçar a todos, que remove qualquer particularidade dos personagens e daquilo no qual eles acreditam. O bem vira algo genérico, e o portanto, o mal também. Isso não combina com uma franquia cujo maior sucesso é a caracterização do Mal e a luta contra ele. Aqui, o Mal é banalizado, diluído para se encaixar em várias perspectivas e, portanto, não é nada palpável.
Ao chegar no suposto "exorcismo" — que está mais para uma coleção de closes em personagens diferentes falando pro mal ir embora, já que não há progressão para o que devia ser uma luta até as portas do inferno — David Gordon Green vai colher os frutos do que plantou, e se vê de mãos vazias. Se não há um base, se não há algo para se crer (afinal, se tudo é verdade, nada é), então não há regras para como derrotá-lo. Não há desafio. Não há linha de chegada. Não há porcos para onde mandar Legião.
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