Cannes: When You Finish Saving the World - Crítica do Chippu

Cannes: When You Finish Saving the World - Crítica do Chippu

Estreia diretorial de Jesse Eisenberg desperdiça ótimos atores e boa premissa

Guilherme Jacobs
18 de maio de 2022 - 7 min leitura
Notícias

CANNES: Não é surpresa que When You Finish Saving the World tenha feito tanto barulho durante o Festival de Sundance em janeiro. Agora exibida durante a semana de críticos em Cannes, a estreia diretorial de Jesse Eisenberg - o ator conhecido por A Rede Social e Zumbilândia - tem todos os marcos dos filmes exibidos durante o evento realizado no começo do ano. Uma comédia dramática colocando atores jovens (aqui, Finn Wolfhard de Stranger Things) em tipos de papéis previamente inéditos nas suas carreiras e dando à estrelas renomadas (Julianne Moore) a oportunidade para brilhar como coadjuvantes que, não tão secretamente, revelam o coração da história.


Diferente de outras ótimas ofertas de Sundance, como Eu, Você e A Garota Que Vai Morrer ou O Maravilhoso Agora, When You Finish Saving The World apenas aspira ao furacão emocional proveniente da mistura de risadas e lágrimas com uma atmosfera honesta e gentil. Wolfhard e Moore interpretam, respectivamente, Ziggy e Evelyn Katz, filho e mãe totalmente narcisistas e voltados para seus próprios mundos. Ele busca a fama e dinheiro, ela apoia diversas causas sociais e quer trazer mudanças genuínas, mas ambos se veem como centro do mundo e não conseguem nem compreender a cosmovisão diferente do outro. Você já sabe para onde isso está indo.


Previsibilidade, no entanto, pode ser perdoada se a jornada pela rota conhecida for bem executada. Eisenberg, dirigindo seu próprio roteiro sem a hiperatividade de suas atuações mais famosas, se mantém perpetuamente na segunda marcha, jamais tirando de seus atores ou da premissa o tipo de impacto possível em sua proposta. A ideia de explorar como a dedicação à consciência política e social não pode vir ao custo da própria família, ou de como é importante para uma nova geração almejar algo além do sucesso viral, é um campo fértil do qual Eisenberg jamais colhe um fruto maduro. Ele se mantém contente com o conceito. Satisfeito em elaborar a trama e seus personagens, o diretor dá dois passos para trás e apenas assiste ao desenrolar das coisas, nos convidando a fazer o mesmo. De fato, há algo bom ali. Teria sido melhor, porém, se essa teoria se transformasse em algo profundo ou interessante. Da maneira aqui apresentada, os protagonistas acabam se tornando frustrantes e cansativos, e a suposta emocionante conclusão é tudo menos isso.


Uma mãe capaz de discursar a favor de diversas causas, conhecedora de vinho e música clássica e tão dentro de outros mundos que deixou seu para trás, Evelyn acaba se fixando na vida de Kyle (Bobby Bryk), o filho de uma residente da sua casa de apoio à mulheres abusadas. Ele é o Ziggy . Ou, pelo menos, é isso que ela acha. Ao depositar suas expectativas neste outro garoto e tentar se transformar numa segunda figura materna para ele, Evelyn acaba perseguindo o jovem para todo lado, tentando convencê-lo a pensar e agir igual à ela vida. A relação, porém, é retratada como um caso severo de stalking. Quando a mãe de Kyle confronta Evelyn, o filme dá a entender que finalmente abordará esse comportamento estranho mas, não. Nada. Moore é excelente em entregar exatamente o desejo de seu diretor, mas a qualidade de sua atuação acaba servindo contra a própria personagem. Diferente do texto, a atriz não é unidimensional. É frustrante vê-la incapaz de crescer no curso da narrativa, presa por correntes impostas antes mesmo dela expressar sua primeira fila.


Enquanto Moore tenta elevar o papel sem conseguir, Wolfhard se mostra incapaz disso. Se When You Finish Saving the World fosse uma comédia sobre um menino besta perdido na tentativa de impressionar uma garota politicamente ativa, ele seria suficiente e até mesmo ideal para o papel, trazendo com si mesmo a combinação ideal de porte desajeitado com confiança irracional para trazer Ziggy Katz à vida. Um cantor numa plataforma meio Tiktok, meio Twitch, ele diz se importar com sua arte mas, na verdade, tem o coração voltado para a fama e promessa monetária geralmente usadas pela internet como forma de tentação. Nas cenas com sua mãe, ou quando seu personagem precisa enfrentar dilemas de escopo maior, ele desaparece.


O que torna ambos arcos tão insatisfatórios, porém, é ver como durante seus percursos paralelos, When You Finish Saving the World apresenta os caminhos para aprimorar e engrandecer seu próprio material. A crush de Ziggy, ao vê-lo fingindo interesse para as causas nas quais ela está envolvida, garante ao menino que uma vida não inteiramente voltada para ativismo não é, necessariamente, uma vida inferior. Roger (Jay O. Sanders), marido de Evelyn e pai de Ziggy, entrega as respostas do teste ao denunciar o egoísmo dos outros membros da família Katz para os dois.


Eisenberg, contudo, ignora os alertas à cerca de sua polaridade simplória, tal qual seus personagens, prefere manter tudo num só tom até a conclusão do filme, quando o mundo e interesses de Evelyn e Ziggy finalmente se cruzam numa sequência fofa (engrandecida pela ótima trilha sonora de Emile Mosseri, cujas notas eletrônicas alcançam alturas fora do alcance do resto da obra), mas cuja inteligência não é tão grande quanto o diretor pensa. Ali, quando devia começar algo novo nessa dinâmica de mãe e filho, quando há potencial para drama e crescimento, ele decide encerrar a obra. A falta de construção dramática até ali remove do encerramento qualquer conquista dramática de consequência, oferecendo a When You Finish Saving the World uma linha de chegada fácil demais depois de uma jornada cujos obstáculos já não eram, desde o começo, grande coisa.


2.5/5

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