Espíritos Obscuros - Crítica do Chippu

Espíritos Obscuros - Crítica do Chippu

Raso, óbvio e sem suspense, filme de Scott Cooper desperdiça ótimos atores e um monstro marcante

Guilherme Jacobs
28 de outubro de 2021 - 6 min leitura
Notícias

Espíritos Obscuros (ou Antlers, no original) começa com uma frase sobre a fúria da mãe natureza, sobre o espírito vingativo solto por ela para punir a humanidade por sua constante exploração do meio-ambiente e falta de cuidado com a criação. Esse é um dos tópicos observados pelo diretor Scott Cooper em seu novo drama de suspense e terror, protagonizado por Keri Russell (The Americans), Jesse Plemons (The Power of the Dog) e o ator mirim Jeremy T. Thomas. Infelizmente, esse tema, como diversos outros na história, são meramente mencionados de maneira rasa e superficial numa trama mais interessada em mencionar ideias do que explorá-las de forma interessante.


Se passando numa cidade rural do Oregon mais parecida com os ambientes frios do leste Europeu de Tarkovsky, Espíritos Obscuros é parte terror de criatura, parte suspense psicológico e parte drama familiar. Russell interpreta a professora Julia, determinada a investigar os acontecimentos ao redor da família do seu perturbado e malnutrido estudante Lucas (Thomas), com ou sem a ajuda do xerife local, Paul (Plemons). O pai do garoto foi atacado por algo misterioso e começa uma transformação monstruosa, seu irmão desapareceu, e agora seus cadernos e pensamentos estão repletos de imagens de dor, sangue e morte. Inicialmente, Julia credita o comportamento do menino a abuso infantil em casa, e então o filme revela seu verdadeiro interesse.


Nos é revelado que ambos Julia e Paul sofreram com um pai abusivo no passado. Em Lucas, a protagonista vê a chance de salvar uma criança de sofrer como ela. A verdade por trás da situação do garoto é mais complicada e sobrenatural, mas é impossível deixar a metáfora mais clara; seu pai, literalmente, se transformando num monstro perigoso. A analogia, entretanto, falha ao nunca desenvolver mais a situação doméstica de Lucas. Sim, ele está sofrendo e podemos simpatizar com sua situação horrível, mas se nunca vimos o quão ruim era o seu relacionamento paterno (na verdade, o que vemos parece mostrar um afeto do garoto, apesar de deixar claro os problemas do pai), o impacto é inferior.


Não há como se enganar, entretanto. Espíritos Obscuros não funciona com sutileza, nem em suas abordagens temáticas e nem na forma como conta sua história. A questão do abuso infantil, pelo menos, é desenvolvido através dos personagens de Russell e Plemons, mas o roteiro demonstra estar interessado em observar o poder e o significado por trás de narrativas construídas por nossas culturas e, como mencionado acima, pela destruição natureza. Estes outros temas, por sua vez, são mencionados como se Cooper e os outros roteiristas - Henry Chaisson e Nick Antosca - como se fossem parte de uma grande checklist. Basta marcar X do lado deles, e pronto. Qualquer investigação mais profunda é deixada de lado em favor de um suspense fraco.


Espíritos Obscuros mantém em segredo revelações que, se esclarecidas anteriormente, poderiam ter ajudado o roteiro a se tornar mais interessante, criativo e único. A insistência de Cooper em guardar detalhes da história se torna prejudicial. Para piorar, as reviravoltas não podem ser chamadas de surpreendentes ou inesperadas. Você vai sacar tudo rapidamente. Sua direção é limpa e direta, mas não adiciona nenhum tempero único ao filme. Seu enquadramento e mise-en-scène favorecem a escuridão e a obstrução, nunca gerando na audiência um senso de geografia e clareza. A cidade, a casa de Lucas, tudo parece ter vindo de um sonho esquecido, desaparecendo depois de você acordar. Se Cooper abraçasse essa ideia com uma direção mais efémera e criativa, Espíritos Obscuros teria uma identidade mais interessante.


Ajuda, entretanto, ter atuações de primeira linha e um ótimo senso de design. Russell se mostra capaz de carregar o filme emocionalmente e mais uma vez condena Hollywood por não lhe dar mais papéis interessantes e importantes, enquanto Plemons, um dos melhores atores da atualidade, adiciona peso e emoção às suas falas mais simples, aprofundando seu personagem e essencialmente salvando o papel.

O longa culmina numa conclusão com ação demais, colocando os personagens em combate direto com a criatura em sequências confusas e pouco empolgantes. Mas, durante todo esse tempo, é impossível não ser conquistado pelo design do monstro. É quase obrigatório para obras produzidas por Guillermo Del Toro terem um design de criatura marcante, e Espíritos Obscuros não fica atrás. O bicho é guardado a sete chaves até os minutos finais da história, mas sua revelação é impactante ao ponto de apagar diversos pecados.


Não é, entretanto, suficiente para salvar o filme. Espíritos Obscuros não assusta, não se destaca e pouco faz para te engajar numa história rasa e óbvia, com um final desnecessariamente ambíguo que provavelmente te fará rolar os olhos, uma tentativa vaga de impactar uma audiência cujos interesses já estão longe da tela.


Nota: 2/5

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