Cruella - Crítica do Chippu

Cruella - Crítica do Chippu

Às vezes ousado e rebelde, Cruella seria melhor se não fosse atrelado a 101 Dálmatas.

Guilherme Jacobs
26 de maio de 2021 - 7 min leitura
Notícias

Um dos maiores problemas nas adaptações live-action de animações da Disney é a falta de identidade, a sensação de nada de novo a acrescentar. Coisas como O Rei Leão são dirigidas e criadas com um cuidado e tecnologia gigantes, mas não apresentam o tempero memorável dos originais. Um desses projetos mais antigos é Cruella. Inicialmente discutido em 2013, o longa-metragem estrelado por Emma Stone finalmente chegou, e quaisquer problemas presentes na produção, pelo menos aqui, há personalidade


Estabelecido na Londres dos anos 70 em meio à revolução punk rock responsável por mudar música, moda e cultura no Reino Unido, o filme usa o mesmo movimento liderado por Joy Division, Siouxsie and the Banshees, e tantas outras bandas para contextualizar a protagonista Cruella é apresentada aqui como uma órfã ladra com sonhos de se tornar uma estilista, o que consegue quando seu caos e design atrai a atenção de Baronesa (Emma Thompson), a fashionista mais poderosa da cidade.


Cruella é a rara adaptação da Disney com uma história diferente do seu material base, a animação 101 Dálmatas, na qual ela é uma vilã pronta para transformar filhotes em casacos. Assim como Christopher Robin imaginou uma nova época para seu protagonista, este filme explora as origens de Cruella, ou melhor, Estella, a perda da mãe, a pobreza na infância, a amizade com Gaspar (Joel Fry) e Horácio (Paul Walter Hauser, hilário) e a paixão por roupas, assim, é claro, como seu relacionamento com cachorros.


A proposta é difícil. A Cruella de Vil de 101 Dálmatas é uma das vilãs mais irreparáveis das animações da Disney, afinal não há muitas maneiras de redimir uma pessoa disposta a matar cachorrinhos. Por isso, a Estella de Stone é explicada de maneira mais aceitável, com histórico de dificuldades financeiras, perdas e até mesmo a indicação de que ela pode sofrer com síndrome de personalidades múltiplas. Esse é, afinal, um filme para toda a família.


Mas, se por um lado, essa é a solução para deixar a vilã aceitável, por outro, isso termina sendo o bloqueio impedindo Cruella de abraçar a atitude daquela época. Dirigido por Craig Gillespie, o longa tenta transmitir a imagem de rebeldia em tudo. A montagem adota uma estética videoclipe em certos momentos, adicionando filtros em frames específicos, manchetes de jornais e montagens musicais, mas sempre há a impressão de algo o impedindo de pirar totalmente. Este ainda tem que ser um blockbuster para todas as idades.


Gillespie tenta compensar muito disso nas escolhas sonoras. "Come Together," “Girls Just Wanna Have Fun”, “Should I Stay or Should I Go” e “Sympathy for the Devil” são apenas alguns exemplos das músicas presentes - às vezes por meio de covers, sem dúvidas mais baratos de licenciar - nas 2 horas e 14 minutos de Cruella. Não há discussão sobre a qualidade da trilha, mas o uso desses clássicos nem sempre alcança o resultado esperado pelo diretor e muitas vezes dão a impressão de um tiozão tentando ser cool para a nova geração.


Onde essa intenção mais dá frutos positivos é nos figurinos da genial Jenny Beaven. Tanto a personagem principal quanto outras figuras como seu amigo Artie (John McCrea) apresentam looks memoráveis repetidamente. Não é só uma roupa diferente ou gritante, mas sim um visual com algo a dizer. Quando Cruella entra em cena diante de Baronesa usando couro preto e com a frase “The Future” grafitada em seu rosto, os temas da revolução cultural britânica da década de 70 são transmitidos de maneira mais eficaz que qualquer outro aspecto da produção. Não há nenhuma sutileza nisso, mas punk rock nunca foi sobre abaixar o volume.


Infelizmente, a narrativa não acompanha o figurino ou a trilha sonora. Boa parte do roteiro é telegrafado e óbvio, seguindo uma estrutura previsível e aparentemente assustada, frequentemente preferindo o caminho mais seguro. É difícil não imaginar como Cruella seria se não estivesse atrelado à Disney. A impressão é de que Stone, Gillespie e outros estão prontos para soltar palavrões, se drogar e se entregar à rebeldia com muito mais força. O relacionamento de Estella com Gaspar e Horácio serve como consciência da personagem e permite uma espécie de arco redentivo no terceiro ato, mas nunca se torna tão cativante quanto os aspectos mais ousados apresentados. É como se não houvesse outra maneira de tornar a personagem malvada e louca, mas ainda relacionável.


Isso é uma pena especialmente quando consideramos a atuação de Stone. Ela é magnética, caótica, engraçada e desequilibrada do jeito certo. Vemos aqui traços de seus trabalhos mais pirados como Birdman e A Favorita, mas são justamente essas obras que nos lembram do poder e potencial dessa atriz. Stone agarra o papel com os dentes, se entrega sem medo e se torna a melhor parte do filme. Thompson, igualmente, está se divertindo como a maldosa Baronesa, e a energia e faíscas presentes em cenas entre as duas Emmas é inegável.


Talvez seja isso que torne Cruella tão frustrante. Há momentos, cenas e ideias cuja combinação de atuação, figurinos e trilha sonora apresenta uma mordida ousada, uma ponta afiada e a vontade de ser rebelde, punk ou até mesmo criminoso. É suficiente para destacá-lo dos outros live-actions da Disney e tornar a experiência divertida. Mas ah, se o filme abraçasse isso tudo sem vergonha ou medo. O que Cruella poderia ser?

Nota: 2.5/5

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