Há 20 anos, em 16 de novembro de 2001, os cinemas internacionais recebiam a estreia de Harry Potter e a Pedra Filosofal, primeiro filme baseado no livro inicial da saga de fantasia infanto-juvenil de J.K. Rowling. O que ninguém imaginava era que uma história infantil sobre um garoto órfão que descobre pertencer a uma família mágica transformaria milhares de crianças e adolescentes em leitores e fãs natos. No caso, eu sou uma dessas pessoas.

Harry, Ron e Hermione já são considerados amigos de longa data, e toda vez que assisto qualquer filme da saga, parece sempre ser a primeira vez. E sei que não sou a única com esse sentimento. A influência de Harry Potter em minha vida foi grandiosa. Fiz diversas amizades que compartilhavam da mesma paixão, fiquei apaixonada por livros de fantasia, passei a amar assistir a filmes e acompanhar religiosamente a cultura pop. Quando A Pedra Filosofal foi lançado, eu tinha apenas um ano de idade, mas ainda criança, fui introduzida a esse universo mágico e nunca mais tive vontade de sair dele. Sou tão fã que até mesmo o meu cachorrinho foi nomeado Dobby, homenageando o elfo doméstico mais querido da saga.

A saga não apenas mudou a vida de diversas crianças ao redor do mundo, mas também dos atores mirins Daniel Radcliffe, Emma Watson e Rupert Grint. A forma como cada um foi escalado no elenco é muito peculiar. Radcliffe, intérprete do menino que sobreviveu, foi encontrado após David Heyman, produtor do longa, ver um trabalho recente do garoto. Mas seus pais não queriam que ele fizesse os testes, por ainda ser muito novo e ter uma carga horária muito pesada. Então, um dia, o produtor seguiu Daniel e seus pais até uma peça de teatro, finalmente convencendo a família do ator mirim.

Já Grint, responsável por viver um dos caçulas da família Wesley, foi escalado após mandar uma fita onde se vestia como sua professora e cantava um rap com alguns motivos para estar no filme. Finalmente, Watson, intérprete da bruxinha mais inteligente de Hogwarts, teve um caminho um pouco diferente. Os produtores iam a diversas escolas para procurar crianças na faixa etária para viverem os personagens, e quando foram ao colégio da Emma, perguntaram a uma professora se havia alguma aluna na sala com a essência de Hermione. Emma, ela respondeu. O resto é história.

Depois de todo esse tempo? Sempre!

É fantástico como, após tanto tempo, os fãs continuam presentes. Em qualquer evento geek, diversas pessoas fazem cosplay dos personagens, sempre esperando por qualquer novidade sobre a saga. Nesta terça-feira (16), a Warner Bros. anunciou que o trio principal de atores voltará para um especial de 20 anos de Harry Potter, no qual o diretor do primeiro filme, Chris Columbus, e o restante do elenco se reunirão para relembrar o legado dos filmes. Nas redes sociais, os amantes do universo mágico celebraram.

Mas essa não é a única novidade de Harry Potter divulgada nas últimas semanas. Em 21 de novembro, Pedra Filosofal será exibida novamente nos cinemas brasileiros, e agora, pela primeira vez, em 3D. As sessões estarão disponíveis nas salas das redes Cinemark, Cinépolis e Cinesystem. Essa será a primeira oportunidade de diversos fãs mais jovens de assistir ao longa em uma sala de cinema, como ele merece ser visto.

O preconceito de J.K. Rowling

Mas mesmo com a permanência de diversos fãs, alguns desistiram de apoiar a saga por conta do preconceito de J.K. Rowling.

Harry Potter soube como tratar de assuntos importantes e delicados de uma forma simples, para qualquer criança ou adolescente entender. A segunda metade da saga começou a introduzir temas políticos, como a ditadura da Professora Umbridge e a Armada de Dumbledore. O mais controverso de tudo é que J.K. Rowling, autora dos sete livros que compõem a saga, vai ao contrário de tudo que foi mostrado ao decorrer da história. Parece até um personagem criado para os livros.

A autora já foi acusada diversas vezes por ser uma pessoa transfóbica. Desde 2012, Rowling vem manifestando as suas opiniões preconceituosas em redes sociais, mas ano passado, em 2020, a situação se tornou ainda mais absurda, atingindo outras pessoas da comunidade.

Após a publicação de uma matéria que usava a expressão “pessoas que menstruam” no título, a autora criticou o uso da frase, dizendo que apenas mulheres menstruam. O artigo tinha como principal objetivo incluir todas as pessoas da comunidade. Assim, Rowling tentou explicar seu argumento de uma forma diferente, mas a atitude continuou parecendo transfóbica. “Se sexo não é real, não existe atração entre pessoas do mesmo sexo. Se sexo não é real, a realidade vivida por mulheres trans ao redor do mundo é apagada. Conheço e amo pessoas trans, mas apagar o conceito de sexo remove a habilidade de muitos discutirem suas vidas de forma significativa. Não é ódio dizer a verdade,” ela afirmou. Assim, Rowling diz que a forma como as pessoas podem se entender é apenas como nasceram. E isso é, sim, uma fala transfóbica, pois está excluindo quem não se identifica com o seu sexo biológico.

Por outro lado, todo o elenco dos filmes manifestou todo tipo de apoio aos trans. “As pessoas trans são quem dizem ser e merecem viver suas vezes sem serem constantemente questionadas ou informadas de que não são quem dizem ser”, disse Emma Watson em sua conta do Twitter.

Um estudo publicado no Journal of Applied Social Psychology revelou que a saga teve um grande impacto na empatia entre os jovens. No artigo, é dito que o público entendia que o significado de “sangue-ruim”, dito muitas vezes por Draco Malfoy (Tom Felton) fazia uma alegoria à tolerância. E esse é um dos motivos pelos quais é ainda mais impressionante entender como uma pessoa que escreveu um universo tão político pode ser tão inconsistente em relação aos princípios escritos por ela mesma.

É muito difícil separar autor e obra. Lidei com essa questão por muito tempo, e ainda me encontro neste meio termo entre crescer amando todo esse universo que me ensinou tanta coisa valiosa, mas discordando de tantas visões da pessoa responsável pelo mesmo.

Mas algo é fato: até hoje, pessoas de qualquer idade se encontram lendo e assistindo a saga, e se apaixonando pela primeira vez. Tudo, afinal, é magia