Cannes: Youth (Spring) apresenta uma boa proposta, e não faz nada com ela - Crítica do Chippu

Cannes: Youth (Spring) apresenta uma boa proposta, e não faz nada com ela - Crítica do Chippu

Lendário documentarista chinês Wang Bing pouco tem a oferecer para preencher mais de três horas de filme

Guilherme Jacobs
18 de maio de 2023 - 3 min leitura
Crítica

Um dos temas recorrentes dos primeiros dias doFestival de Cannesdeste ano é a longa duração de filmes. Dentro disso, dois documentários tomaram a pole no ranking de “idas aos banheiro durante a exibição”. O ótimo Occupied City de Steve McQueen faz valer a maior parte de seus 262 minutos, Youth (Spring) do lendário documentarista chinês Wang Bing pouco tem a oferecer para preencher suas 3 horas e 32 minutos.

Juntos, esses dois longas-metragens oferecem uma ótima evidência a favor do argumento de Roger Ebert de que não existe um filme bom cuja grande duração aniquile seus méritos, nem um filme ruim cujo curtinho espaço de tempo lhe garanta total perdão por seus erros. O filme de McQueen tem quase uma hora mais, mas é a obra de Bing que parece interminável. Curiosamente, ambos adotam uma estrutura episódica, que no caso deYouth (Spring)se traduz em diversos episódios centrados nas múltiplas fábricas têxteis na cidade de Zhili, próxima de Shangai, onde vários chineses (a maioria entre 16 e 23 anos) gastam horas e horas produzindo milhares de peças de roupas. Incluindo, provavelmente, a que você está vestindo agora.

Youth (Spring), porém, é tão capaz de comunicar seus temas, interesses e críticas num ou dois desses segmentos, como em sua totalidade. Se, por exemplo, acompanhássemos apenas a vida de um dos dezenas de jovens mal-saídos da adolescência cujo trabalho beira a escravidão nesses armazéns sem vida, entenderíamos toda a mensagem de como a indústria da produção, desenfreada, está roubando a juventude de pessoas, forçando-as a passar longas horas em ambientes fechados em troca de uma recompensa pífia. Ao invés disso, porém, Bing repete o método inúmeras vezes.

São diversos planos de pessoas costurando, diversos debates sobre salário com os chefes, diversas risadas trocadas por colegas nos poucos momentos de respiro. Alguns protagonistas são mais engraçados, outros mais curiosos, mas nenhum registra como particularmente interessante o suficiente para aguardarmos ansiosamente por sua próxima aparição.

A frustração é engrandecida pela ciência de que há um bom filme aqui. Por mais que esse método vérité de documentar o dia-a-dia dos trabalhadores confira ao filme um caráter semelhante ao da realidade dessas pessoas (passamos, assim como eles, um longo período de tempo olhando para as mesmas mesas de costura, os mesmos beliches velhos e as mesmas paredes desbotadas), esse tédio proposital não é contraposto com nada. Em cima dele vem mais tédio, mais tédio, e mais tédio.

Certamente, é possível enxergar a abordagem com bons olhos. A denúncia da sociedade dos números, da China atual e de nossa indulgência em vaidade é perspicaz, mas depois de apresentar seu argumento inicial com certa destreza, Bing se mostra contente em repetí-lo ad eternum, acreditando que o empenho intensificará seu impacto. Youth (Spring), porém, talvez faça um trabalho bom demais em reproduzir a rotina monótona de seus protagonistas.

2/5

Nota da Crítica
Guilherme Jacobs

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