Invasão Secreta flerta com a excelência em primeiros episódios promissores - Crítica Sem Spoilers

Invasão Secreta flerta com a excelência em primeiros episódios promissores - Crítica Sem Spoilers

Série de espionagem da Marvel conta com um dos melhores elencos do estúdio até hoje

Guilherme Jacobs
21 de junho de 2023 - 8 min leitura
Crítica

A proposta de Invasão Secreta pode facilmente se tornar barata. A raça de alienígenas Skrulls, com seus poderes de transmorfos, se infiltra em diversas posições de destaque na Terra e começa a armar uma conspiração para tomar controle do planeta. Não precisa se esforçar muito para imaginar isso virando uma sequência de reviravoltas no estilo "seu herói favorito, na verdade, é um Skrull." O quadrinho de onde a nova série do Disney+ toma seu nome, é meio que isso. Felizmente, a adaptação encabeçada pelo Nick Fury de Samuel L. Jackson quer ir além disso.

Quanto além? O suficiente. Invasão Secreta não fará pela Marvel o que Andor fez por Star Wars, explorando seriamente o estado social de um universo fictício através da lente de uma trama de espionagem tão bem construída como um romance de John le Carré. Estamos falando de algo mais na linha de Missão: Impossível e Jason Bourne, mas sem sequências de ação muito eletrizantes. Sem elevar muito seu jogo de espiões, a série diverte, cativa e empolga como quase nenhuma outra do MCU foi capaz até hoje, muito por ter um senso claro de qual história está contando, uma produção sólida que parece ancorada no mundo real, e não num palco de um estúdio em Atlanta, e um dos melhores elencos já reunidos neste selo.

A lista é, de fato, impressionante. Ao lado de Jackson, temos Ben Mendelsohn, Emilia Clark, Kingsley Ben-Adir e possivelmente a melhor atriz em atividade: Olivia Colman. Sendo uma produção da Marvel, Invasão Secreta muitas vezes os encarga com a entrega de diálogos didáticos, pesados em exposição e pouco inspirados. Quando, porém, o texto Kyle Bradstreet e sua equipe de roteiristas almeja caracterizar bem seus heróis e vilões, ele encontra ótimos colaboradores em cada papel. Consequentemente, Invasão Secreta se torna um dos mais magnéticos programas da Marvel, e talvez o melhor desde Loki. Quando cada cena é interpretada por alguém de alto calibre, é difícil tirar os olhos.

Os atores e seus personagens bem definidos apontam para o principal elemento por trás do sucesso inicial da produção: Uma narrativa pensada e construída para se firmar em seus dois pés. Invasão Secreta pode dever sua existência aos eventos de Capitã Marvel, mas pelo menos nos dois primeiros episódios enviados para críticos, essa é uma história independente. Não um derivado de um derivado, não uma cena pós-créditos estendida ou e não só uma preparação para Armor Wars. Os acontecimentos tem um peso emocional para os envolvidos, e consequentemente, recuperamos aquela velha sensação que um dia tornou esse universo tão popular: isso é importante. Não apenas porque vai explicar um filme futuro, mas porque ligamos para essas pessoas e para o que elas estão passando.

No núcleo disso está um conto sobre promessas quebradas. O que acontece quando um homem cuja palavra normalmente é garantia, alguém capaz de enxergar três passos à frente no tabuleiro, falha em cumprir seu juramento? Nick Fury é uma figura quase mitológica dentro do Universo Marvel, não à toa o desastre de Vingadores: Guerra Infinita é pontuado com sua morte e a vitória fúnebre de Ultimato com seu retorno. Em Invasão Secreta, ele é humanizado, e com isso seus erros se tornam mais aparentes. Um dia, ele prometeu achar uma nova casa para os Skrulls. Décadas se passaram. E agora?

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Para seu fiel amigo Talos (Mendelsohn), isso pode significar esconder algumas coisas, mas também é necessário manter a fé. Para Gravik (Ben-Adir), significa guerra. Um dos raros exemplos de vilões do MCU cuja perspectiva é tão bem trabalhada quanto a dos protagonistas, o novo líder dos Skrulls é um extremista forjado em parte pelas incompetências de Fury ao longo dos anos, e nas mãos de um dos mais promissores atores jovens do momento, ele comanda toda cena em que aparece.

Eu suspeito que isso mudará, porém, quando ele encarar Sonya Falsworth (Colman). Num patamar de atuação como poucos e poucas, a atriz britânica transforma, com seu humor ácido e charme venenoso, sua versão de uma M de 007 em alguém muito mais digna do termo "super spy" do que o próprio Fury, pontuando os temas da série de que talvez, só talvez, nosso protagonista esteja enferrujado.

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Mas se Fury não é mais o mesmo, Jackson está melhor do que nunca na Marvel. Seu talento para atuação não é novidade, mas seu status significa que, graças à forte presença na cultura pop ao longo dos últimos 30 anos, ele nem sempre precisa se esforçar para preencher bem a tela. Aqui, ele não se deixa cair na caricatura de si mesmo, e traz novos tons para seu personagem. Particularmente ao lado de Talos, vivido por Mendelsohn com vulnerabilidade palpável, Fury mostra ainda ter gás no tanque.

O nível desses atores significa que as cenas boas de Invasão Secreta se tornam melhores, mas nem eles impedem a série de parecer uma grande explicação às vezes. Há mais conversas honestas do que o normal para séries da Marvel, mas também há muitas situações onde todos parecem pisar no freio para nos lembrar de um conceito, objeto ou plano. Nessas horas, a direção pouco inspirada de Ali Selim se torna mais evidente. Invasão Secreta pede um olhar mais afiado, uma criação de atmosfera mais intensa, um ar mais denso, mas Selim não chega lá. O visual dos capítulos iniciais ainda deixa Cavaleiro da Lua, Gavião Arqueiro, Mulher-Hulk e afins no chinelo, mas a premissa, elenco e texto praticamente clamam por uma ambientação mais forte que nunca vem.

Ainda assim, é um princípio intrigante. Ao invés de cair nos truques baratos de tentar chocar repetidamente a audiência com Skrulls no lugar de rostos conhecidos (até então, isso só acontece na primeira cena), Invasão Secreta pauta suas traições e segredos em relacionamentos pessoais. Longe de ser um estudo de caráter tão profundo como O Espião Que Sabia Demais ou algo confortável na sujeira como Slow Horses, a série ainda trabalha bem o gênero onde se encontra, e especialmente quando deixa seus atores esticarem os músculos, ela flerta com a excelência. Precisaremos de mais episódios para descobrir se ela chega lá, ou se como Skrulls infiltrados em governos e mídia, é só aparência.

Nota da Crítica
Guilherme Jacobs

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