
Cavaleiro da Lua: Invoque o Traje - Crítica com Spoilers
Steven Grant, não Marc Spector, toma o holofote no segundo episódio de Cavaleiro da Lua

Crítica
Este texto contém spoilers de "Invoque o Traje", segundo episódio de Cavaleiro da Lua
Por quem você torce em Cavaleiro da Lua? Em apenas dois episódios, em grande pela atuação tragicômica (e eu digo isso como um elogio) de Oscar Isaac, é difícil não criar uma torcida e carinho pela figura de Steven Grant. Nesse segundo capítulo da nova série da Marvel, a relação entre as duas consciências neste corpo - e a presença de Khonshu (F. Murray Abraham) - são mais exploradas e, apesar de acabar com a ambiguidade em relação ao estado mental do protagonista, a série cria uma dinâmica fascinante entre o britânico desajeitado e o espião norte-americano Marc Spector, que Isaac interpreta com um estoicismo frio contrastante em relação à sua outra personalidade.
É preciso dar crédito ao roteiro de Michael Kastelein. A decisão de tornar o monstro que atacou Steven no fim do primeiro episódio em algo invisível e de manter a dúvida sobre o estado mental do protagonista até se tornar necessário trazer respostas deu um bom tempero de ambiguidade para o desenrolar do capítulo. Isto sendo a Marvel, é claro que nunca entramos num território realmente assustador da questão psicológica de Steven, e é claro que deuses e magia existem e isso explica os poderes e visões de Steven, mas a série trabalhou bem a dinâmica de realidade e ilusão até bater o martelo de uma vez por todas. O que, entretanto, está deixando a série mais interessante é a maneira como ela está firmando suas perguntas diretamente no personagem central.
Como Arthur Harrow (Ethan Hawke) levantou: Khonshu escolheu Steven por que sua mente seria facilmente quebrada, ou por que ela já era quebrada? Esse homem sofre com múltiplas personalidades ou teve outra consciência transportada para dentro de si? Algumas séries da Marvel usaram mistério de maneira barata (Falcão com o Mercador do Poder, Gavião Arqueiro com o “chefão”) só como desculpa para manter o interesse da audiência de semana a semana e dar aos fãs algo para especular. Talvez (provavelmente) Cavaleiro da Lua, como WandaVision, eventualmente se entregue ao super heroísmo em troca do desenvolvimento de personagem, mas por hora, o debate volta para Steven. É menos importante, para nós, descobrir o segredo por trás da história, do que saber se ele ficará bem. A série faz um ótimo trabalho de despertar em nós o interesse em entender o que acontece com o protagonista, mas não para sacar referências ou easter eggs, e sim por nossa simpatia com ele.
Isso é, em grande parte, graças à brilhante atuação de Isaac como o personagem desajeitado, mas também melancólico. O ator nos transporta para dentro de sua cabeça como um homem assustado e desesperado. Quando Harrow aparece, o tratando bem e prevendo as falas de Khonshu, entendemos perfeitamente a reação de confiança inicial vinda de Steven. Finalmente. Alguém o compreende. O roteiro trabalha bem a apresentação completa do vilão, com Hawke exalando o tipo de carisma visto em líderes de seitas mas também desarmando a entidade, tratando-o quase como uma criança birrenta. F. Murray Abraham colabora com essa construção ao dosar sua voz grave com gotas de impaciência e quase prazer na tortura de Steven. Sua interação final com Marc, na qual ele ameaça possuir a esposa do americano (Layla, vivida por May Calamawy, e por enquanto sem muito propósito na trama), deixa claro os lados mais questionáveis da divindade. Marc é seu prisioneiro, como Arthur diz ter sido, e, no final, como Steven acaba virando.
Cavaleiro da Lua cria um contraste interessante entre os dois lados de seu protagonista. Marc, por horas, faz quase um comentário do diretor - o que às vezes gera um efeito cômico interessante - e também parece abalado pelas afirmações ditas por Harrow, mas eventualmente entra em cena com o traje clássico do personagem. O momento, porém, não é tão legal quanto quando Steven, quase sem querer, invoca o traje do Mister Knight, uma das versões do herói nos quadrinhos. A interpretação dela, aqui, é totalmente diferente, e alguns fãs podem ficar frustrados com a abordagem de piada, mas esse ainda é um triunfo da parte de Steven.
Infelizmente, a sequência de ação posterior, culminando com a entrada de Marc e a vitória sobre o chacal, não acompanha o sucesso do roteiro e nem tira as preocupações com efeitos especiais e a direção visual levantadas semana passada. A perseguição pelos telhados parece inteiramente artificial, confusa, e a criatura não é bem-feita o suficiente para criar uma sensação real de ameaça. Quem sabe com a ida ao Egito, isso mude. As cenas no deserto foram gravadas presencialmente no Jordão, e podem dar à série um visual mais palpável. Veremos.
O segundo terço de Cavaleiro da Lua (a série terá seis episódios) também apresenta outro desafio para a série, este mais interessante. Os dois capítulos iniciais fizeram um ótimo trabalho em desenvolver nossa simpatia com Steven. Marc pode ser um agente secreto, assassino ou mercenário, mas vê-lo trancando Steven dentro da mente não é suficiente para gerar em nós vontade de passar tempo com ele. Nossa torcida está com sua outra metade. Se, porém, Cavaleiro da Lua trabalhar o lado Spector da coisa tão bem quanto fez com o Grant (e a dinâmica com Khonshu e Layla certamente tem potencial), então veremos algo realmente especial.

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